Blog em homenagem à novela de Walther Negrão, exibida entre 1996/1997, às 18h, pela TV Globo

O eterno herói planeja virada na carreira


Depois de três décadas marcando a história da TV com bons moços e alguns tipos divertidos, o galã da novela das 6, da Globo, sonha em apresentar um programa de auditório.

Com 33 anos de carreira e uma coleção de galãs inesquecíveis em 29 novelas, fora minisséries e especiais, Tony Ramos, de 48 anos, encara o enigmático Floriano, de Anjo de Mim, a novela das 6, da Globo.

Dono de uma boa memória, o ator recorda com detalhes cada personagem que defendeu. E conta que pensou em recusar um dos papeis mais marcantes de sua carreira, o Riobaldo da minissérie Grande Sertão: Veredas.

Feliz por fazer parte "da bela história da TV", revela que gostaria de ter sido repórter esportivo e seu projeto de comandar um programa de auditório.

Enquanto não o realiza, se divide entre as gravações da novela no Rio, o Você Decide e a peça Cenas de Um Casamento, em São Paulo.

Estado - Como enfrenta a maratona de gravar novela no Rio, apresentar o Você Decide, ao vivo, e fazer teatro em São Paulo?

Tony Ramos - Há alguns anos não fazia TV e teatro ao mesmo tempo. Eu havia prometido fazer um trabalho por vez. Já estava em São Paulo, com a peça Cenas de Um Casamento, quando a direção da Globo me chamou para me mostrar a sinopse da novela. Achei fascinante um folhetim dentro da temática espiritualista. Conheço o autor Walther Negrão há 31 anos, ele sabe colocar os condimentos necessários para temperar a trama. Não resisti. Não tem sido fácil. Conciliar tudo exige muita organização. Gravo a novela no começo da semana no Rio, viajo para São Paulo na quarta-feira para gravar o Você Decide e já fico para fazer a peça. Às vezes, saio de São Paulo, vou para o Rio e volto para São Paulo no mesmo dia.

Estado - O que Anjo de Mim reserva para o seu personagem depois que ele ficou paralítico?

Tony - Não tenho a menor ideia do que vai ocorrer com o Floriano. Nem de quem é a Valentina com quem ele irá ficar. Pode ser até que Valentina seja uma figura que ainda não foi cogitada Só o autor sabe. Estamos apenas no 82° capítulo, até o 182° inúmeras situações inusitadas vão ocorrer.

Estado - Mas você não tem curiosidade?

Tony - Não gosto de saber o que vai ocorrer com o personagem. Gosto de receber os capítulos e ser surpreendido. É uma técnica boa para a minha atuação, me ajuda a representar e a não desperdiçar emoções.

Estado - Você costuma conversar com o autor sobre o seu personagem?

Tony - O autor sabe o que quer e não cabe a mim mudar, opinar. Jamais liguei para um autor. Quando a novela começa, fazemos várias reuniões até esgotar as dúvidas sobre o personagem, a trama. É o suficiente.

Estado - Sua participação no primeiro episódio de A Comédia da Vida Privada foi muito elogiada. Quando voltará a fazer comédia?

Tony - Fiz muita comédia no teatro. A Comédia da Vida Privada foi de primeira, rapidinho, bem gostoso de fazer. Juca, de A Próxima Vítima, foi outro momento adorável. Gosto de humor, mas não escolho autor, diretor, colegas, estúdio, horário. Para mim tudo é trabalho e faço da melhor maneira possível, com prazer.

Estado - Houve casos de você recusar um personagem?

Tony Ramos - Quando Walter Avancini me chamou para fazer o Riobaldo em Grande Sertão: Veredas, achava que não tinha nada a ver com o personagem, que não conseguiria fazer um jagunço. Mas Avancini me falou que nem todo jagunço era como o Lampião e provou que eu poderia fazer. Foi um dos meus melhores papéis.

Estado - Você se consagrou como o herói romântico, mas ganhou o respeito da critica com personagens inusitados. Como encara os desafios?

Tony - Se o papel me surpreende, não importa que seja o galã ou o bandido. Sempre me deram os papéis heroicos por causa do meu tipo físico. Todos os personagens têm contradições, fraquezas. Por mais bonzinho que ele seja tem falhas de conduta Quem consagra o ator é o público, que percebe essas diferenças e estabelece um código de cumplicidade, não os críticos. Nunca fiz um personagem como um ser perfeito, sempre procurei inquietar o público.

Estado - Como o público vê o Floriano?

Tony - Certo dia, uma senhora me disse: "Vá lá que Floriano tenha seus problemas, mas ele está brincando com as moças, é bonzinho, mas não age corretamente". É isso, estou atingindo o que queria.

Estado - Com 33 anos dc profissão, quais foram seus papéis mais marcantes na TV?

Tony - Fui o galã da maioria das novelas da Janete Clair. Não dá para esquecer o Márcio Haiala, de O Astro, um dos maiores sucessos da TV, o André Cajarana, de Pai Herói, os gêmeos de Baila Comigo. Como vou esquecer o Riobaldo, de Grande Sertão: Veredas, o Jorge, de O Primo Basílio, o Eduardo Figueroa, de A Rainha da Sucata? E o Tônico, de Bebê a Bordo, que parecia um maluco carregando uma criança de um lado para o outro? Para fazer o Juca, de Próxima Vítima, tive de engordar seis quilos. E fascinante ter feito todos esses papéis. Mais atrás há Nino, o Italianinho, Antônio Maria, Ídolo de pano, A Viagem. Sei que faço parte da bela história da TV. É gratificante.

Estado - Você coleciona material sobre esses trabalhos?

Tony - Minha mulher guarda alguns recortes desde a década de 60. Tenho várias novelas gravadas. Sou um dos poucos que têm Grande Sertão: Veredas do princípio ao fim.

Estado - Como telespectador, como se vê em cena?

Tony - É muito raro assistir à cena que acabo de gravar. Prefiro ver em casa sem gente do lado. Eu falo muito, fico comentado, viro um telespectador desagradável.

Estado - A família dá palpite?

Tony - Minha filha e minha mulher dão, mas não ficam querendo saber o que vai acontecer na novela.

Estado - Você sempre quis ser ator?

Tony - Fiz faculdade de Filosofia, mas não terminei. Entrei para Direito, para a Escola Superior de Propaganda e também não conclui. Comecei a carreira de ator novo. Queria continuar estudando, mas trancava a matricula toda vez que começava uma peça.

Estado - Quando optou definitivamente por ser ator?

Tony - Um dia parei e vi que a carreira de ator era fundamental, que tinha de me firmar e seguir em frente. Não foi fácil, era uma época em que havia atraso de salário e cheguei a fazer dublagens para ter um troco a mais. Tive de me virar.

Estado - É verdade que você fez parte de uma dupla de cantores, Tom e Toni, na época da Jovem Guarda?

Tony - Nem me lembro o nome da dupla. Esses eram os nossos apelidos da turma do bairro. Tinha 17 anos. Eu e meu amigo de infância Antônio Carlos, um sociólogo, estávamos tentando ganhar dinheiro. Ele conheceu um diretor do programa Jovem Guarda, que era apresentado por Roberto Carlos. Cantávamos versões de músicas em inglês que o Roberto fazia, como Esqueça-me. Não tínhamos pretensão, só ilusão. Não tinha como dar certo, tanto que não deu.

Estado - O que você faria de diferente na sua vida?

Tony - Hoje, faria tudo diferente em relação aos estudos. Estudaria História, Geografia, faria um curso fora do Pais. Pode parecer maluco, mas digo para a minha mulher, Lidiane, que gostaria de ficar sem fazer teatro durante cinco anos para voltar a estudar à noite. Mas a esta altura não dá, tenho a agenda apertada. Até o final de 97 vou viajar com a peça e, terminando a novela devo pular uma e já entrar em outra.

Estado - E cinema?

Tony - Não fiz muitos filmes. O último foi sabre a vida da Leila Diniz. Fiz o papel do pai dela. Agora, deve estrear O Pequeno Dicionário Amoroso, de Sílvia Werneck. Fiz o Minas Texas, que ainda não foi lançado.

Estado - Existe algum sonho que não foi realizado?

Tony - Gostaria de ter sido repórter esportivo. Adoro futebol, sou são-paulino desde que nasci. Na Tupi, houve uma tentativa do Walter Abraão. Dênis Carvalho narrava o jogo e eu era o repórter de campo. Fizemos duas vezes. Agora meu sonho é virar um executivo de TV, trabalhar na área de produção, direção. Gostaria de apresentar um programa com participação do público, auditório. Quem sabe daqui a dois anos?

Estado - Você já exercita o lado apresentador no programa Você Decide.

Tony - No inicio da minha carreira, apresentei um programa sobre publicidade, o Opinião Pública, durante dois anos. Logo que entrei na Globo, apresentei o musical Globo de Ouro, ao vivo. E, hoje, estou adorando apresentar o Você Decide.

Estado - Pensa em escrever a sua trajetória?

Tony - Escrever é um dom que eu acho que não tenho. Minha timidez e autocrítica me impedem. Mas tenho outras ideias, além do programa. A TV a cabo abre possibilidades. Não paro de pensar. Um dia vou mostrar um trabalho novo. Mas não tenho pressa.

Estado - Você está na TV Globo há 20 anos. Nunca pensou em mudar de emissora, já recusou convites?

Tony - Acho muito delicado falar sobre isto. Já fui cutucado por outras emissoras, mas não há motivos para sair da Globo. Lá, trabalho com prazer.

Estado - Além de futebol, do que você gosta?

Tony - Gosto de fotografar, de literatura sobre culinária, vinhos. Leio muito sobre turismo. Gosto de viajar com Lidiane para lugares escondidos.

Estado - O casamento continua bem?

Tony Ramos - Continuo bem-casado, apaixonado pela minha mulher. Vamos fazer 28 anos juntos. Meus filhos (Rodrigo, médico de 26 anos e Andréa, advogada, de 24) estão ótimos. Continua tudo i-gual-zi-nho.




Fonte: jornal O Estado de S. Paulo
Data de publicação: 1º de dezembro de 1996
Repórter: Carla França

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