Blog em homenagem à novela de Walther Negrão, exibida entre 1996/1997, às 18h, pela TV Globo

Ela leva sua fé para "Anjo de mim"


Adepta do espiritismo, a atriz diz que a novela das seis, que estreia amanhã tendo a regressão a outras vidas como tema, veio no momento certo para ajudá-la a entender a morte da filha de dois anos.

Depois de dois anos afastada das novelas, Tássia Camargo está de volta em Anjo de Mim, que estreia amanhã, no horário das seis, na Globo.

Na história de Walther Negrão, ela é a marchand Antônia, namorada do escultor Floriano (Tony Ramos), o herói da trama, que fará uma regressão para descobrir por que não está conseguindo mais trabalhar.

Kardecista, como o autor da novela e a sua personagem, Tássia acredita em vidas passadas e se prepara para fazer um retorno a outras vidas. "Gostaria de entender o porquê das coisas serem como são", diz.

Aos 35 anos, a atriz que se destacou em papéis sensuais mantém o ar de menina sapeca, apesar das tristezas que tem vivido. A maior delas, em consequência da morte da filha Maria Júlia, de dois anos, em janeiro.

Mãe de Pedro e Diego, de 12 e 9 anos, ela conta que só sobreviveu graças à religião. Depois de perder Maria Júlia, também se separou do marido, o músico Mário Boffa, com quem esteve casada por 11 anos. Mudou-se e, para a casa nova, não levou nada do que tinha dentro da antiga - de móveis a talheres e brinquedos, doou tudo para um orfanato.

Agora, além da religião, busca na terapia, que faz junto com os filhos, o caminho para o equilíbrio.

Estado - Como é sua personagem Antônia?

Tássia Camargo - É uma marchand que tem uma relação antiga com o escultor Floriano (Tony Ramos), apesar de não morarem juntos. Ela ama Floriano, mas tudo entre eles começa a mudar quando ele passa a ter sonhos repetidos e dificuldades para esculpir. Antônia e Mestre Quirino (Milton Gonçalves) são espiritualistas. Sugerem, então, que Floriano faça uma regressão. O que ela não espera é que nessa regressão ele encontre outra mulher, com quem marcou encontro no passado. Floriano passa a procurar a mulher em quem aquela do passado reencarnou. E ela pode ter reencarnado até em um homem, ou na própria Antônia.

Estado - Enquanto Floriano fica nessa busca, o que acontece com Antônia?

Tássia - Ela vende a galeria em Embu, em São Paulo, para ir atrás de Floriano em Petrópolis, no Rio, no capítulo 17, eu me afasto por 20 capítulos. Quando volto, Floriano já está envolvido com várias mulheres e não sei o que acontecerá com eles.

Estado - Para embarcar nessa história, é preciso acreditar em reencarnação?

Tássia - Bem, estou embarcando porque sou Rosa Cruz há 11 anos - que não é religião, mas uma filosofia de vida - sou kardecista também e frequento o centro Irmão Samaritano, no Rio. Não acredito em coincidências. Essa novela veio no momento certo porque perdi minha filha em janeiro. Maria Júlia faleceu com dois anos. Tudo o que eu precisava era de um trabalho que estivesse encaixado com o que acredito. A novela tem outros atores espiritualistas, como Milton Gonçalves, Gracindo Jr. e acho que Tony Ramos.

Estado - Vocês conversaram sobre essa coincidência antes do início das gravações?

Tássia - Conversamos na primeira reunião, mas escuto mais do que falo. É um assunto delicado. Quem não acredita acha que você está louca e quem acredita conversa sobre isso horas.

Estado - Já fez ou tem vontade de fazer regressão?

Tássia - Estou procurando uma pessoa que faça para mim. Aconteceram tantas coisas na minha vida de dois anos para cá que eu gostaria de entender. Foi por acreditar em reencarnação que consegui segurar a onda da morte da minha filha.

Estado -Você pode contar o que aconteceu?

Tássia - Posso. Maria Júlia nasceu normal, mas tinha baixa resistência imunológica. Então adoecia com facilidade, mas era linda. Pela autópsia, descobrimos que ela pegou um vírus, um caso raro. Se não morresse aos dois anos, morreria aos 12.

Estado - Como a doença se manifestou?

Tássia - De um dia para outro, percebi que ela não estava me ouvindo. Depois, não enxergava, não andava. Daí para frente, ficou numa UTI, em hemodiálises, ligada a aparelhos.

Estado - Como você superou isso?

Tássia - Não dá para explicar. Três meses depois foi que me dei conta de que a havia perdido. Aí, foi uma depressão.

Estado - Como a religião ajuda nessas horas?

Tássia - Sei que ela foi para um lugar mais bonito. Acho que tinha de cumprir sua missão. De repente, ela volta, ou não. Acreditar nisso me ajudou e me deu forças. No dia em que faleceu, um pouco antes, eu fui perto do ouvido dela e disse: "Filha, se liberta, para onde você for, vou estar com você". Ela estava inconsciente e, mesmo assim, chorou. O médico ficou intrigado e eu disse para ele que a alma dela havia me ouvido. (chora).

Estado - Você quer mudar de assunto?

Tássia – Não, é bom falar. Naquele mesmo dia, fui tomar um banho na casa de um amigo. No chuveiro, pedi a Deus que limpasse a doença dela de alguma forma. Soube depois que ela morreu nesse momento.

Estado - Como foi seu dia seguinte?

Tássia - Muito difícil... Mas agradeço a Deus por ter me levado para um lado bom. Uma semana depois, Roberto Farias me convidou para fazer um Você Decide sobre uma criança que tinha problemas mentais e eu me desafiei a fazê-lo porque, do contrário, acabaria não fazendo mais trabalhos nos quais tivesse de aparecer grávida ou com um filho doente. Foi meu único trabalho, desde então. A gente tem de enfrentar a vida. E Deus dá a dor para quem consegue segurar. Ainda bem que não fui para o lado das drogas. É claro que tive a fase de ficar trancada, mas não enlouqueci porque tenho outros dois anjos comigo, que são Pedro e Diego. Então, acreditar em outra vida, fora daqui, ajuda.

Estado - Mas bate essa vontade de procurá-la em outras pessoas, como acontecerá na novela?

Tássia - O que me segura é a esperança de ainda encontrá-la. Claro que vai estar de uma outra forma. Mas quando eu encontrar, vou saber.

Estado - É por isso que você quer fazer a regressão?

Tássia - Não, é para entender o por quê das coisas serem como são. Porque não foi só Maria Júlia. A partir de 1994, as coisas aconteceram de forma louca. Começou com Maria Júlia sendo operada de um tumorzinho causado pela vacina BCG. Depois, descobri, por intermédio da espiritualidade, que tinha um embrião de tumor no tórax.

Estado - Como assim?

Tássia - Um dia, acordei com urna sensação estranha no peito e disse para meu marido que teria de ser operada. Não deu outra. Acontecem coisas estranhas assim. Aos 17 anos, ouvi uma voz que me dizia que eu iria morrer aos 35 e morri porque, quando completei 35, minha filha faleceu. De alguma forma, eu morri. Além disso, naquela mesma época, meu pai faleceu e meu ex-sogro, que é meu amigo, caiu e está há dois anos em coma. Depois que Maria Júlia virou estrelinha, eu me separei. Queria entender por que nós duas fomos as escolhidas e não tenho medo de fazer regressão.

Estado - Está difícil fazer a novela?

Tássia - Um pouco. Houve cenas em que tive de me emocionar e não queria me lembrar de Maria Júlia para isso. Mas quando ia me concentrar, ela me vinha à cabeça. Aí, tive um bloqueio: o choro vinha e não saía. Até que um dia, no meio da gravação, o diretor Ricardo Waddington parou tudo e me deu um abraço. O choro veio logo.

Estado - Seus trabalhos têm apelo sensual forte. Este também?

Tássia - Esse tem, mas é uma sensualidade discreta, de uma mulher apaixonada.

Estado - Se tivesse de fazer um papel sensual, agora, teria problemas?

Tássia - Nem, um pouco, pois todos os trabalhos que fiz desse tipo não tiveram nada de grotesco.

Estado - Por conta dessas personagens, você se tornou objeto de desejo. Como encara isso?

Tássia - É mesmo? Aos 35 anos, será que ainda sou? Meu filho diz que sou uma adolescente gostosa. Para quem teve três filhos, acho que estou inteira. Ouço dizerem que sou bonita, mas acho que é uma forma de carinho.

Estado - Você se acha bonita?

Tássia - Eu me acho normal. Tenho um metro e meio, não uso saltos, minhas unhas são curtas e não uso maquiagem. De qualquer maneira, o amadurecimento muda as pessoas. Não tenho mais vontade de usar shortinhos como aos 22 anos. O corpo até permite, mas não me sinto bem.

Estado - O fato de no elenco da novela existir vários espiritualistas ajuda ou atrapalha? Por exemplo, vocês se preocupam se a história está falando bobagem?

Tássia - Mas o Walther Negrão também é kardecista. Ele sabe sobre o que está escrevendo e isto nos dá segurança. Não tem abobrinha no texto.

Estado - O que a levou ao kardecismo?

Tássia - Primeiro, me tornei Rosa Cruz, filosofia que defende a reencarnação. Meu ex-marido já era, fui com ele e me interessei. O kardecismo eu conheci mais tarde, levada por um amigo, na época de Maria Júlia.

Estado - Você mudou muito?

Tássia - Estou mais quieta, ouvindo mais, mais magra. Mas as pessoas esperavam me encontrar mais abatida e estão me dizendo que estou bem, que até remocei. No trabalho, dizem que estou menos ansiosa.

Estado - Isso faz com que busque coisas diferentes para a sua carreira?

Tássia - Sim. Comecei no teatro com Antunes Filho e estou com vontade de voltar aos palcos. Quero encenar clássicos porque tenho feito mais trabalhos de humor, nos últimos tempos. Estou lendo algumas coisas com o diretor Ulysses Cruz que me perguntou se eu tinha medo de enlouquecer. Respondi que o que mais quero é enlouquecer.



Fonte: jornal O Estado de S. Paulo
Data de publicação: 8 de setembro de 1996
Repórter: Sônia Apolinário

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