Blog em homenagem à novela de Walther Negrão, exibida entre 1996/1997, às 18h, pela TV Globo

As muitas vidas de um ator


Milton Gonçalves vive uma das melhores fases de sua carreira.

Se através de seu trabalho o ator é capaz de viver muitas vidas, Milton Gonçalves certamente está passando por uma de suas encarnações mais ricas. Na pele do místico Mestre Quirino, ele é um dos destaques da novela Anjo de Mim, da Rede Globo, e atualmente também pode ser visto no elenco do musical Roque Santeiro.

Interpretando um artesão que auxilia o protagonista Floriano Ferraz (Tony Ramos) em suas incursões por vidas passadas, o ator é um dos elementos-chave da trama. O papel de guru das regressões representa um marco numa carreira que já conta 38 anos.

O ator tem sentido nas ruas o resultado desse trabalho. Convidado recentemente para um seminário, na Uerj, sobre pessoas superdotadas, Milton roubou a cena e enfrentou uma verdadeira bateria de perguntas sobre o personagem.

Para compor Mestre Quirino, uma das primeiras providências de Milton foi se municiar de livros sobre espiritismo e regressão. O ator confessa a sua crença em alguns princípios espíritas como a reencarnação, o que talvez explique o desempenho convincente na novela. "Acredito em algumas coisas predeterminadas em nossas vidas", diz ele.

Certos fatos da carreira de Milton podem servir como exemplo dessa predeterminação. Escalado para viver o padre Hipólito na primeira versão de Roque Santeiro, em 1975, o ator chegou a gravar dez capítulos. Com a censura imposta ao texto de Dias Gomes e a proibição da novela, Milton foi obrigado a desistir de um personagem excepcional.

Anos depois, em 1985, Paulo Gracindo acabou interpretando um inesquecível padre Hipólito. Coincidência ou destino. Milton Gonçalves participou da novela no papel de um promotor que desafiava o poderoso Sinhozinho Malta.

Da trajetória pontuada de sucessos, o ator assume um ar de nostalgia ao falar do Teatro de Arena, em São Paulo. Nas décadas de 50 e 60, Milton participou de um dos mais importantes movimentos teatrais do Brasil, ao lado de nomes como Gianfrancesco Guarnieri, Oduvaldo Viana Filho e os diretores Augusto Boal e José Renato. "Ali aprendi tudo o que sei", conta.

Acostumado a se dividir entre os estúdios e os palcos, Milton Gonçalves está em cartaz no Teatro João Caetano com - mais uma vez - Roque Santeiro. Dessa vez, ele finalmente assume o papel do bonachão padre Hipólito, 21 anos depois da censura televisiva.

Outro motivo de orgulho é a carreira do filho Maurício, que está no elenco da novela Xica da Silva, na Manchete. Mas, nem sempre foi assim. Milton relembra o horror de Maurício na infância em relação à carreira artística e, particularmente, à televisão.

O menino reclamava do assédio sofrido pelo pai, que na época dirigia e atuava na versão original de Irmãos Coragem. "Ele achava que a TV ia nos afastar", recorda.

Como os espectadores podem atestar, o trauma foi superado e o legado artístico paterno falou mais alto. Ou, como preferiria Mestre Quirino, isso também estava escrito.


Fonte: Jornal do Brasil
Data de publicação: 17 de novembro de 1996

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